quarta-feira, 18 de maio de 2011

“Tem coisas que não dá para fingir que não vê”



Seja qual for o número de abusos sexuais em crianças que se vê nas estatísticas, seja quantos milhares forem, devemos ter em mente que, de fato, esse número pode ser bem maior. A maioria desses casos não é reportada, tendo em vista que as crianças têm medo de dizer a alguém o que se passou com elas. E o dano emocional e psicológico, em longo prazo, decorrente dessas experiências pode ser devastador.
O abuso sexual às crianças pode ocorrer na família, através do pai, do padrasto, do irmão ou outro parente qualquer. Outras vezes ocorre fora de casa, como por exemplo, na casa de um amigo da família, na casa da pessoa que toma conta da criança, na casa do vizinho, de um professor ou mesmo por um desconhecido.
A violência sexual é um pesadelo na vida de muitas crianças e adolescentes. Os números na Bahia são alarmantes: De acordo com dados do Ministério Público Estadual, a violência sexual contra crianças e adolescentes tem crescido de forma preocupante. Em 2005, foram registradas 225 denúncias; em 2006 este número aumentou para 467. Já em 2007, o Centro de Apoio Operacional a Promotoria da Infância e Juventude, recebeu, através da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, 1.229 relatos de casos de violência sexual; em 2008, foram registradas 1.646 denúncias e, em 2009, 1.585. No ano de 2010 foram registradas 1.356 denúncias.

A bola está com você - Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes: O que você tem a ver com isto?


Recente pesquisa da BBC de Londres identificou que o Brasil tem sido um dos 27 países que influencia positivamente o mundo. Entretanto, as vésperas de completarmos 21 anos da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente lei 8069/90, dezesseis anos do início da Campanha para o Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, o quadro de proteção a população infanto-juvenil não faz jus a esta constatação. No país do futebol, do carnaval, da corrupção, do sucateamento da educação continuamos com a temática da exploração e violência sexual contra crianças e adolescentes.
Os números mostram o inferno a que estão submetidas as nossas crianças. Dados do Disque Denúncia Nacional (Disque 100) indicam que, desde maio de 2003 até março deste ano, foram feitas mais de 63 mil denúncias de abuso. A Bahia é o Estado que registra mais ligações (7.708), seguido por São Paulo (7.297) e Rio de Janeiro (5.563). Infelizmente, não há dados oficiais sobre o número exato de crianças e adolescentes que vivem essa realidade no país.
Em 2010 foram registrados 12.487 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. No primeiro trimestre de 2011, já houve 4.205 casos, sendo a maioria das vítimas do sexo feminino. Apesar de várias campanhas de combate à pedofilia, este parece ser um ano muito sombrio, as pessoas têm ignorado o assunto e por isso o demônio da pedofilia segue atuando, destruindo e aterrorizando muitas famílias, gerando sofrimento, pois há confusão, desinformação, medo e vergonha.
Há uma evolução, em 2006, registrou-se denúncias de 882 municípios, em 2010 foram de 4.886. Entre 2003 e 2010 o Disque 100 realizou um total de 2.556.775 atendimentos e encaminhou 145.066 denúncias de todo o país.
No Brasil e no mundo a pedofilia avança de forma preocupante na internet, são inúmeros os casos de denúncias, violência contra menores de idade seguidos de abuso sexual.
As pesquisas e registros constatam que cerca de 70% dos estupros ocorrem no âmbito familiar, as crianças normalmente começam a ser abusadas sexualmente aos 7 e 8 anos. Ao completar 12, 13 anos, elas começam a ter noção de sexualidade falam sobre o abuso com a mãe ou vizinhos. Se a vítima é criança, o caso é descoberto quando alguém flagra ou percebe o comportamento alterado dela.
Para intervir precisamos saber - Qual a diferença entre abuso sexual e exploração sexual? 
O abuso é qualquer ato que ofenda a pessoa, extrapolando os limites do desenvolvimento ou exercício autônomo e sadio de sua sexualidade, visando unicamente à satisfação de um desejo sexual próprio do agressor, ou seja, no abuso sexual, o agressor procura unicamente satisfazer seus desejos mediante a violência sexual. 
Por sua vez, a exploração é a obtenção de alguma vantagem, financeira ou não, diversa do prazer oriundo da violência. Caracteriza-se por ser uma relação mercantil, em que o agredido é considerado mera mercadoria. 
Mas afinal - Quem é o explorador?  É um criminoso comum.  Os principais violadores não são desconhecidos, são pessoas que vivem próximas ou, na maioria das vezes, aquelas em que a vítima mais confia. No Brasil, a cada oito minutos uma criança é vítima de abuso sexual. De acordo com o Ministério da Justiça, 60 mil crianças são violentadas sexualmente por ano e 82% têm entre 2 e 10 anos e, em 90% dos casos, o violador é um membro da família - pai biológico, padrasto, tios, avôs ou irmãos.
O quadro pode ser modificado portanto, A bola está com você - Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes: O que você tem a ver com isto? Tudo! O primeiro passo é não calar-se, porque tem coisas que não dá para fingir que não vê. Violência sexual contra crianças e adolescentes é crime.
Precisamos incentivar a denúncia, pois “Quem cala, consente” e buscarmos soluções conjuntas para o drama vivido por muitas meninas e meninos. Não basta ser apenas no período de carnaval, quando milhões de pessoas circulam pelas ruas das cidades ex: Salvador, Rio de Janeiro, Recife. Precisamos identificar e combater diariamente as redes interestadual e municipal de exploração sexual infanto-juvenil no Brasil.
Você pode contribuir na sua cidade procurando através dos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Tutelar, de Assistência Social, Delegacias de Polícia, Vara da Infância, CRAS e CREAS.  Quais afinal são as políticas públicas, visando à prevenção e o combate à rede exploratória, bem como a garantia do cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente em sua cidade?
É possível constatarmos que as mobilizações têm gerado denuncias, mas lamentavelmente a maioria dos municípios brasileiros não dispõe das Varas Criminais Especializadas da Infância e Juventude, impedindo a celeridade na apuração e julgamento dos crimes.
Precisamos saber - Quais os serviços disponíveis as vitimas e abusadores?
Setores apontados como facilitadores da exploração sexual nos Estados também tem sido sensibilizados ao longo das mobilizações, caminhoneiros, desestimulando o transporte de adolescentes e alertando para o perigo de facilitar a exploração de meninas, postos de gasolinas e bares em beira de estradas, entrada de cidades e casas noturnas.
Precisamos fortalecer as ações com o apoio do Governo do Estado, das Prefeituras Municipais e Universidades, incluindo a campanha em seus discursos e políticas oficiais, na formação continuada das Polícias Federal, Militar e Civil para assumirem papéis estratégicos no enfrentamento da questão e, também, os profissionais da Educação tem papel importantíssimo nesta luta, desenvolvendo ações de formação, prevenção e orientação das famílias, dos alunos e da comunidade.
 
 *Reginaldo de Souza Silva – Doutor em Educação Brasileira, professor do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas e coordenador do Núcleo de Estudos da Criança e do Adolescente – NECA/UESB. Email: necauesb@yahoo.com.br

sábado, 7 de maio de 2011

18 DE MAIO É O DIA NACIONAL DO COMBATE A EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES

 


VAMOS TODOS ERGUER NOSSA BANDEIRA E COMBATER OS CASOS
  DE ABUSO SEXUAL CONTRA NOSSAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES
                                POIS ESSA LUTA É DE TODOS NÓS.
                                                DENUNCIE:
                                           CONSELHO TUTELAR
                                           MINISTERIO PUBLICO
                              POLICIAS CIVIL, MILITAR E FEDERAL
                                                  DISQUE 100

A TODAS AS MÃES QUE LUTAM PORQUE ACREDITAM NO AMOR SUPREMO!

Esta história pode representar tantas outras que acontecem diariamente em nosso país. Em 1916, em brejo de Areias no sertão do Estado da Paraíba, uma menina com mais 11 irmãos e irmãs, tentou, como uma parcela significativa dos chamados nordestinos, sobreviver. Viveu na casa do seu avô em um pequeno sítio de propriedade da família onde lá experimentou o aconchego e a dura vida do campo. 
Na pobreza da região nordeste do Brasil, sobejamente conhecida, nesse pequeno sítio, tudo era partilhado com muita dificuldade, mas também havia a felicidade e o carinho como tem sido em muitas famílias que lutam para sustentar e educar seus filhos neste imenso país.
A menina começou desde cedo, como milhares de crianças e adolescentes, a ajudar nos trabalhos domésticos e assim foi ganhando experiência. Aos doze anos de idade, para ajudar no sustento e na sobrevivência da família, começou a trabalhar na casa de um professor universitário. Lá aprendeu o que significava estar longe do seu lar, de sua família. Lá, teve sua primeira experiência de vida e as siladas que o coração permite sobre a necessidade do afeto: sua primeira experiência amorosa e dois filhos não reconhecidos.
Não podendo criar esses filhos, seu pai e sua mãe acharam por bem assumir a paternidade e a criação dos mesmos. E, na inquietude da juventude, como toda jovem mulher em busca da felicidade, nas voltas que a vida dá, apaixonou-se mais uma vez e resolveu, como muitos nordestinos, ir para São Paulo, a terra prometida, onde tudo parecia ser mais fácil: mais opções, mais empregos. 
Seguiu em um caminhão pau-de-arara e chegou a tão falada cidade. Como era grande! Quanto movimento, quantas luzes, quanta agitação! Lá teve mais três filhos e enfrentou várias dificuldades e muitas humilhações. Na terra prometida lhe faltava tudo: um lugar para morar, emprego, comida, afeto, o cheiro da terra querida, a sua cultura. Restava a saudade da família distante. 
Mesmo assim acreditava que tudo iria mudar. Um dia, sem muitas explicações, o seu companheiro foi embora, deixando-a para trás, sozinha com três crianças, sem família, sem emprego e sem ter onde morar. 
A vontade era a de voltar para o nordeste, para a sua família, para a sua terra. Mas como? O que iria dizer? Como poderia explicar? Como iria sobreviver por lá agora tinha mais três crianças? Nesse momento, acreditando que existia um Ser superior que, com certeza, poderia ajudar, resolveu permanecer em São Paulo e enfrentar o que viesse.
Conseguiu, assim, uma oportunidade de emprego como empregada doméstica. Mas a patroa foi logo dizendo que precisaria dormir no emprego e que as crianças, ali, não poderiam ficar. Mas quem poderia cuidar das suas crianças enquanto ela cuidava das crianças dos outros?
A patroa ofereceu, então, como ajuda, a indicação de um colégio interno no interior do Estado de São Paulo, distante 500 km da capital, onde poderia deixar as crianças. Nesta época estava em pleno funcionamento a Política Nacional do Bem Estar do Menor, representada pela FUNABEM e FEBEMs nos vários Estados brasileiros. Esta política, com o discurso de proteção ao “menor”, punia as famílias pobres que, muitas vezes, não tinham condições de cuidar de suas crianças. Pobres, as crianças eram então rotuladas como “abandonadas” e, portanto, como medida de proteção, eram internadas em instituições públicas e/ou subsidiadas pelo Estado.
Não tendo outra opção, a jovem mãe teve que separar a família e encaminhou os dois irmãos para uma instituição masculina e a irmã seguiu para outra cidade. Uma vez por ano, a mãe buscava as crianças para passar as “férias” na capital onde trabalhava. Ao deixá-las de volta na instituição, as prometia que um dia viria buscá-las definitivamente.
E trabalhou para isso: noite e dia, até que entendeu que poderia começar a morar fora da casa do patrão. Mas, quando isso aconteceu, ligaram do colégio avisando que as crianças não poderiam ficar mais lá. Essa foi a resposta da patroa.
No quarto alugado de 12 metros quadrados com uma cama, um fogão, um pequeno guarda roupas e um banheiro externo (para ser dividido com outras 10 famílias que ocupavam quartos iguais) começou a reconstrução do seu lar.
Aos doze anos seus filhos foram levados para morar junto com ela, porque já podiam trabalhar. Depois do trabalho, quantas vezes eles ficavam aguardando a mãe também chegar do emprego com a primeira refeição do dia, pois sabiam que ela traria consigo a comida, que deveria ser o seu almoço no trabalho.
Mesmo sem saber ler e escrever a mãe exigiu dos filhos que estudassem e um deles terminou a graduação, o mestrado e chegou a “virar doutor”. Com o seu emprego de doméstica (que não tinha direito a domingos, feriados e nem festas de fim de ano), a mãe criou os três filhos e os salvou da morte, marginalidade e do abandono. E o tempo foi passando... e através do trabalho precoce e exaustivo de todos, a família superou a pobreza extrema.
Este é o breve relato da história da minha mãe que não mais poderei beijar, abraçar, dar carinho e agradecer por me permitir chegar até aqui, pois já partiu para descansar dessa difícil jornada.
Aproveito esta oportunidade, então, contanto a sua história, para homenageá-la e a todas as mulheres, professoras da Candelária, Realengo, Vitória da Conquista, Bahia e Brasil, a todas as mães que, com determinação e amor supremo conseguem, muitas vezes sozinhas e sem a presença do homem que um dia amaram, criar os seus filhos e filhas.
E, àquele(a)s que ainda têm a oportunidade de conviver com o aconchego de sua mãe (biológica ou de criação), que não percam a oportunidade de agradecê-la, amá-la, respeitá-la e fazê-la muito feliz. Pois não basta dizer que as amam, é preciso demonstrar, é preciso que elas sintam-se amadas!
Agradeço a Deus por minha mãe ALICE e desejo a todas as mulheres/mães um FELIZ DIA DAS MÃES. 
*Reginaldo de Souza Silva – Doutor em Educação Brasileira, professor do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas da UESB. Email: reginaldoprof@yahoo.com.br.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Sem orçamento e participação popular, direitos de crianças e adolescentes continuarão apenas no papel

Ascom/Ministério Público do Estado da Bahia
As políticas públicas definem o modo como viveremos e como nossas crianças crescerão. Desta maneira, elas não podem ser elaboradas apenas pelos gestores, sem a participação da sociedade e sem diálogo. Apenas a existência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não pode garantir a transformação da realidade das crianças e adolescentes do nosso país. Suas previsões precisam sair do papel, se tornarem realidade. E sem previsão orçamentária, isso nunca acontecerá. Estes foram alguns dos pontos comuns abordados no do ‘I Ciclo Preparatório para os 21 Anos do ECA: Lugar de Criança é no Orçamento’, em Vitória da Conquista, pelo procurador-geral de Justiça Wellington César Lima e Silva, pelo reitor da Universidade Estadual do Sudoeste (Uesb), Paulo Roberto Pinto Santos e pelo promotor de Justiça Millen Castro.

“Poderíamos sintetizar o significado desse encontro em três palavras: participação, protagonismo e orçamento”, disse o chefe do Ministério Público baiano ao abrir o evento. Segundo ele, a participação popular é o que dá substancialidade a uma democracia, que a torna real e não apenas um simulacro de democracia. “Vivemos numa quadra de muita perplexidade no país no que diz respeito à qualidade da nossa representação política. E a única forma de produzirmos um salto qualitativo nesse domínio não é com uma atitude simplificadora, nem tampouco com a atitude de abdicar de participar da cena”, ressaltou o procurador-geral de Justiça, afirmando que a atividade política é uma necessidade do viver em sociedade, por isso as pessoas devem despir-se de preconceitos e serem motivadas à aproximar-se do fenômeno político, cobrando as necessárias políticas públicas.
“Alguns ideais reclamam mais que participar; é preciso protagonizar. E o papel do Ministério Público é este que está sendo exercido aqui (nesse evento). O MP não pode ser tutor da sociedade e nem deve pretender sê-lo. Ele deve estimular que a sociedade se organize cada vez mais e melhor. Este é o papel do Ministério Público: entronizar a sociedade no debate das principais questões da cidadania”, salientou Wellington César. Ainda de acordo com o PGJ, o ECA é um dos diplomas legais mais avançados do mundo, mas “de nada adianta ter uma boa lei se não tivermos vontade política e condições materiais de implementá-la totalmente”. Segundo ele, a existência de um marco legal como o ECA é apenas um ponto de partida. O ponto de chegada é a efetivação desses direitos, “que somente se viabilizará na medida em que tivermos as condições materiais necessárias. Por isso é fundamental que exista a previsão orçamentária”. E, para que isso ocorra, é preciso que as pessoas que trabalham nessa área estejam familiarizadas com o tema, afirmou o procurador-geral de Justiça. “A importância prática desse evento é essa: consolidar uma reflexão com uma ação”, concluiu.
Esse “papel de articulador social”, acrescentou o promotor de Justiça Millen Castro, foi conferido ao Ministério Público pela Constituição Federal de 1988. E, segundo ele, esse papel deve ser ainda mais incisivo na área da infância e juventude. Por isso, explicou, “este evento não é de capacitação, mas de convocação, articulação e sensibilização. A ideia é que todos saiam daqui instigados a estudarem e a trabalharem com a questão do orçamento”, disse o coordenador do Núcleo de Apoio para Implantação, Estruturação e Fortalecimento dos Conselhos de Direitos, Tutelares e Fundos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (Naic). O promotor de Justiça lamentou a ausência de prefeitos e vereadores no evento – que conta com cerca de 400 pessoas – e afirmou que é preciso “quebrar a caixa preta do orçamento”. “Eu gostaria de ouvir porque os prefeitos e vereadores não estabelecem, no orçamento, a prioridade absoluta para a infância e juventude”, frisou Millen Castro. “E a resposta é: porque não houve provocação da sociedade”. Segundo ele, a participação popular prevista na Constituição só vai-se efetivar quando realmente os conselhos de direitos forem fóruns de discussão.
O promotor de Justiça informou, ainda, que o Naic está fazendo um diagnóstico para saber como é a estrutura e como estão funcionando todos os Conselhos Tutelares e de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCAs) da Bahia, que dará uma dimensão de como é a atuação dos municípios nessa área. Ele lamentou que muitos conselhos tutelares ainda estejam utilizando o Ministério Público como “muletas”, não assumindo o seu protagonismo no papel de defesa das crianças e adolescentes, e o fato de que os CMDCAs não assumirem o papel de elaboração das políticas públicas para a infância e juventude. Como resultado, explicou Millen, na maioria dos municípios são os prefeitos e vereadores que definem, sozinhos, essas políticas, “porque a sociedade ainda não assumiu o papel de protagonista na sua elaboração”.
Também participaram do evento o coordenador da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça, juiz Cláudio Daltro; o procurador do Trabalho Marcos de Jesus; a secretária municipal de Assistência Social de Vitória da Conquista, Nádia Márcia Campos; o presidente da Fundacem, César Montes; o presidente da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Vitória da Conquista, Guttenberg Macedo Júnior, dentre outros.
A primeira palestra do evento, sobre ‘Intervenção judicial sobre o orçamento público e a prioridade absoluta na Infância e Juventude’, foi feita pela procuradora do Trabalho Rosângela Lacerda, e teve como debatedor o promotor de Justiça da Infância e Juventude de Vitória da Conquista, Marcos Coelho, e como moderador o advogado do Núcleo de Defesa da Criança e do Adolescente da Uesb, Michael Alencar Lima. Abrindo os debates sobre o tema, Marcos Coelho chamou atenção para duas previsões constitucionais (do art. 204, que trata das ações governamentais na área da assistência social) que passam despercebidas de todos: a questão da descentralização político-administrativa e a participação popular, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.
Segundo o promotor de Justiça, a Constituição Federal previu esta democracia participativa porque quis assegurar que, cada vez mais, a sociedade civil seja protagonista nas decisões sobre as políticas públicas. Mas, lamentou Marcos Coelho, há uma má vontade da maioria dos participantes dos conselhos de direitos em participarem das reuniões do CMDCA. “A política pública na área da Infância e Juventude está sendo discutida ali naquele palco. Se a sociedade não assumir o seu papel, o que vai ocorrer? O chefe do poder político vai ‘deitar e rolar’, e tomara que ele seja uma pessoa séria. Mas se ele fizer qualquer coisa errada, qual a moral que nós da sociedade teremos para poder criticar se nós não participamos na instância correta?”, protestou o promotor de Justiça, conclamando todos a participarem ativamente desses conselhos, até para legitimar a atuação do Ministério Público. “Se vocês não ocuparem os Conselhos e acharem que eles são coisa muito séria e continuarem se omitindo no seu município, nada vai mudar. Vocês podem participar de dezenas de ciclos, ouvir dezenas de palestras, mas nada vai mudar!”, concluiu.

Difamação contra crianças e adolescentes no Orkut é crime de competência da Justiça Federal


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a competência para julgamento dos crimes de difamação contra crianças e adolescentes por meio do site de relacionamento Orkut é da Justiça Federal. Os ministros da Terceira Seção consideraram que esse tipo de crime fere direitos assegurados em convenção internacional e que os conteúdos publicados no site podem ser acessados de qualquer país, cumprindo o requisito da transnacionalidade exigido para atrair a competência do Juízo Federal.

Uma adolescente teve seu perfil no Orkut adulterado e apresentado como se ela fosse garota de programa, com anúncio de preços e contato. O delito teria sido cometido por meio de um acesso em que houve a troca da senha cadastrada originalmente pela adolescente. Na tentativa de identificar o autor, agentes do Núcleo de Combate aos Cibercrimes da Polícia Civil do Paraná pediram à Justiça a quebra de sigilo de dados cadastrais do usuário, mas surgiram dúvidas sobre quem teria competência para o caso: se o Primeiro Juizado Especial Criminal de Londrina ou o Juizado Especial Federal de Londrina. O Ministério Público opinou pela competência do Juízo Federal.

O ministro Gilson Dipp, relator do caso, entendeu que a competência é da Justiça Federal, pois o site não tem alcance apenas no território brasileiro: “O Orkut é um sítio de relacionamento internacional, sendo possível que qualquer pessoa dele integrante acesse os dados constantes da página em qualquer local do mundo.” Para o relator, “esta circunstância é suficiente para a caracterização da transnacionalidade necessária à determinação da competência da Justiça Federal”. Gilson Dipp destacou também que o Brasil é signatário da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, que determina a proteção da criança em sua honra e reputação.

O relator citou uma decisão anterior da Sexta Turma do STJ, no mesmo sentido. No caso, o entendimento da Corte foi de que “a divulgação de imagens pornográficas envolvendo crianças e adolescentes por meio do Orkut, provavelmente, não se restringiu a uma comunicação eletrônica entre pessoas residentes no Brasil, uma vez que qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, poderá acessar a página”. No precedente se afirma que “a competência da Justiça Federal é fixada quando o cometimento do delito por meio eletrônico se refere a infrações estabelecidas em tratados ou convenções internacionais, constatada a internacionalidade do fato praticado”.
O relator observou que essa dimensão internacional precisa ficar demonstrada, pois, segundo entendimento já adotado pelo STJ, o simples fato de o crime ter sido praticado por meio da internet não basta para determinar a competência da Justiça Federal.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

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